Cuidado com a Cuca, que a Cuca te pega…

Não! Dessa vez, a Cuca não pegou ninguém! Mas o personagem da obra “Sítio do Picapau Amarelo”, de Monteiro Lobato (1882-1948), serviu de inspiração para uma peça escrita e encenada, no dia 14 de outubro, por integrantes das equipes de Serviço Social, Multiprofissional e administrativos, abordando o tema da violência contra a criança e o adolescente no atendimento pediátrico no Hospital Estadual Getúlio Vargas.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n° 8069/90, corresponde ao conjunto de normas do ordenamento jurídico brasileiro que tem como objetivo a proteção integral da criança e do adolescente. É um marco legal e regulatório dos direitos humanos de crianças e adolescentes, que conforme o artigo 2º, define: “criança é a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”.

Os direitos fundamentais garantidos relacionam-se ao Direito à Saúde, Direito à Convivência Familiar e Comunitária, Direito à Educação, Esporte e Lazer, Direito à Dignidade, Respeito e Liberdade e Direito à Preparação e Proteção ao Trabalho. Quando tais direitos são violados, está caracterizada uma situação de risco pessoal e social, isto é, estão presentes circunstâncias que negligenciam o desenvolvimento saudável (Artigo 7º ECA), da criança e do adolescente, como a exposição à violência física e psicológica, o uso de substâncias psicoativas, exploração sexual, abuso sexual, trabalho infantil, entre outros.

A violência contra crianças e adolescentes é presenciada em diversos contextos, seja no ambiente familiar, nas escolas, nas ruas, podendo ser manifestada de diferentes formas, não excludentes entre si. Em toda situação de violência, deve haver uma intervenção de qualquer pessoa que conheça do fato. O Artigo 13 do ECA prevê que “os casos de suspeita ou confirmação de maus tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais”.

E é este o procedimento das equipes que atuam na emergência pediátrica do Hospital Estadual Getúlio Vargas.

O Serviço Social, ao ser acionado pelo profissional que primeiro identificou a ocorrência (equipe médica, de enfermagem ou busca ativa por meio de abordagem a beira leito), verifica em prontuário o registro da situação suspeita de violência. O serviço de Psicologia, em conjunto com o Serviço Social, otimiza a escuta qualificada e acompanha o caso. Realiza-se atendimento individual à criança/adolescente, responsável legal, familiares ou pessoas de referência, buscando identificar a situação de negligência ou violência. Em todos os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos, o HEGV comunica imediatamente ao Conselho Tutelar, à Vara da Infância e, em casos de crimes, à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA).

“Considerando que as emergências pediátricas possibilitam desnudar a trama da violência, o Assistente Social faz sua intervenção nesta questão, pautado na legislação vigente, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, e norteado pela defesa intransigente dos Direitos Humanos, buscando, assim, prevenir novas ocorrências. A articulação com as demais Políticas Públicas potencializará um redutor de danos, no que tange à violação de direitos de crianças e adolescentes. Utilizamos nosso caráter crítico e interventivo para a efetivação da garantia de direitos e fortalecendo a rede de proteção. E sim, aqui o ECA te pega, pois no HEGV, criança e adolescente têm prioridade!”, afirma a Assistente Social Kelly Cristina Ferreira, Coordenadora de Serviço Social.

O ECA tem uma formulação muito clara sobre o papel do setor saúde e do setor educacional, tratando-os como esferas públicas privilegiadas de proteção que recebem incumbências específicas: a de identificar, notificar a situação de maus-tratos e buscar formas (e parceiros) para proteger a vítima e dar apoio à família. Nele, os artigos do Capítulo I, que tratam dos direitos fundamentais garantidos às crianças e aos adolescentes, abordam a proteção à vida e à saúde, desde a sua concepção, determinando as ações que devem garantir o atendimento à gestante e o acesso irrestrito dos meninos e meninas aos serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde através do Sistema Único de Saúde – SUS (Art. 11).

“Em sua trajetória, o Hospital Estadual Getúlio Vargas desenvolve uma série de iniciativas em favor da proteção integral das crianças e adolescentes e o ECA é um balizador importante para essa ação. Na unidade, é de suma importância que todos os atores do Sistema Único de Saúde conheçam o Estatuto da Criança e do Adolescente e se conscientizem da importância de suas atitudes, ações e práticas profissionais, visto que cada caso envolve o destino de uma criança ou adolescente”, enfatiza a Diretora Técnica, Dra. Flávia Nobre.

O Unicef destaca que a violência está entre os maiores desafios para garantir os direitos das crianças e dos adolescentes brasileiros. Uma publicação do Fundo das Nações Unidas e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, lançada em 2021, apontou que, entre 2016 e 2020, houve quase 35 mil mortes violentas intencionais de crianças e adolescentes. O cenário mapeado pelo estudo trazia um aumento da violência, com os dados mostrando 27% mais mortes entre crianças de até 4 anos e 44% dos crimes acontecendo na residência das vítimas.

Para o IPCEP e a Direção do Complexo Estadual de Saúde da Penha, o Estatuto da Criança e do Adolescente é um marco e, ao mesmo tempo, um aprimoramento na proteção da infância no Brasil. Nesses 32 anos, destacou-se pelo reconhecimento de direitos humanos de crianças e adolescentes, além de assegurar a proteção a esse grupo para a garantia de seu desenvolvimento integral. Nele, o setor saúde recebeu um mandato social especial, para atuar nos diagnósticos de maus-tratos: cabe-lhe o dever de notificar.

No Hospital Estadual Getúlio Vargas, é o ECA quem pega.

 

Fontes: Governo Federal – Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; Estatuto da Criança e do Adolescente; Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef); Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP); Childhood Brasil; e Coordenações de Serviço Social e Psicologia do Complexo Estadual de Saúde da Penha. Fotos: IPCEP.